Sinto que não sou a mesma. Parte
de mim ficou nas mãos de ontem. Perdeu-se. Perdi-me. Não sei se ainda posso me
resgatar, mas a ideia de remendar-me, é repudiante. Preciso de mim por inteiro.
Essa parte que se foi, fatalmente, logo me faltará.
Faço uso de uma licença
hipotética para chorar palavras desalinhadas numa prosa poética repetitiva,
cansativa e com um quê de patética. Corro o risco de ser chata, mas ontem
mostrou-me que os chatos podem ter vez. Chatos também têm seu momento de
glória, ao contrário dos despedaçados. Ontem desafiou Cazuza e mostrou a céu
aberto, para quem quisesse ver: há sim perdão para os chatos.
Ontem não foi cruel só com
Cazuza, foi comigo também. Ficou com uma parte minha, que eu nem reconheço qual
ainda. Mas já me faz falta. Pior é que creio ter sido por pura impureza, só por
maldade, quis me atingir. Logo eu, que o recebi de braços abertos, quando ainda
era amanhã... Acho que foi isso. Ansiei por ontem, criei alguma expectativa, e
ele sentiu-se pressionado. Pronto, mistério desvendado.
Quis que ele fosse um hoje
especial, como tantos outros foram, e se orgulharam de ser. Mas já que, por
força das circunstâncias, não pôde me encantar, resolveu me mutilar só para
marcar. Ah, ontem... A gente podia ter funcionado. Seríamos uma grande
parceria, pena que optamos por sermos adversários. Podíamos ser gozo e orgasmo,
mas acabamos em lágrimas.
Hoje, coitado, já chegou em
desvantagem. Não tem tudo de mim, como ontem teve. Ainda estou em fragmentos,
procurando descobrir qual parte de mim ontem reteve. Os próximos hojes, aliás,
não me conhecerão como ontem conheceu. Acho que, no fim, ontem obteve seu
sucesso. Marcou- me, assim como desejara, e ainda mais do que esperara.