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“Escrevo porque encontro nisso um prazer que não consigo traduzir. Não sou pretensiosa. Escrevo para mim, para que eu sinta a minha alma falando e cantando, às vezes chorando..." (Clarice Lispector)

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Expurgo


Não irei repetir isso. Foi a última noite de erro consecutivo. Não mais te procurarei, nem corresponderei. A brincadeira disfarçada de ingênua, fadada ao desastre, registra hoje seu game over. Prematuro, mas inadiável, o fim do que nunca começamos pisca num neon ofuscante de letras garrafais.

Agora com alguma clareza, percebo que você mesmo talvez o tenha posto à minha vista. Sempre atiçando, mas sempre se esquivando, numa dança patética e fora do meu ritmo. Mostrava que me queria, e fugia quando podia. Só eu, iludida, para ainda sequer pensar em te procurar.

E era o que eu fazia. Corria para a praça dos que cantam, passava pelos bares dos tantos que dançam, cruzava sons de samba, funk, jongo, MPB... E nada de você. Via rostos conhecidos e queridos por você, camisas suas, barulhos seus, bebidas suas, mulheres suas, lugares seus, mas me faltava o seu olhar. Aquele que me desnuda. Aquele que me arrepia. Aquele que me intimida. Aquele pelo qual venho buscando nas noites há dias. Aquele que se perdeu de mim e fez com que eu me perdesse também.

Fiz uma ideia bem diferente de você. Soube de suas muitas mulheres e de seus poucos amores, então, te projetei uma liberdade emocional que não se mostrou real. De fato, você não está algemado, mas encontra-se mais enlaçado do que percebe. Ou, ao menos, do que se permite transparecer.

Por falta de força, embora não de vontade, estou te expurgando de mim. Só te peço que deixe de me perturbar. Chega de Cartola, Bethânia e Chico, pois eles não poderiam ser testemunhas de um encontro que nunca esteve às vésperas de acontecer. Chega de um “ah, se eu vou” que nunca vai. Não me faça salivar, se não poderei degustar, não me olhe faminto, se não haverá banquete. Eu não aguento. Mentiras sinceras até podem me interessar, mas raspas e restos, não. Eu dispenso.




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